Não costumo comentar decisão judicial, especialmente quando não tenho acesso aos autos, mas como o assunto envolve duas áreas do Direito que gosto muito – Direito do Consumidor e Direito Eletrônico – impossível não dar um “pitaco”.

Bloquear um serviço de comunicação de toda uma população porque não teria o aplicativo(fornecedor do serviço) informado dados de um usuário supostamente criminoso me parece autoritário e desproporcional.

Não encontro fundamento para isso na Constituição Federal, no Marco Civil da Internet e menos ainda no Código de Defesa do Consumidor.

Se houve descumprimento de decisão judicial por parte do aplicativo, que é o que se sustenta, que se aplique multa diária pesada contra o aplicativo (astraintes), sem prejuízo de processo para apurar crime de descumprimento por parte de seus representantes legais.

O que não pode ocorrer, em primeira análise, é a suspensão do serviço como forma de ameaça. Isso é inadmissível!

Os prejudicados, sem dúvida, serão os consumidores.

Mas pode surgir uma pergunta: a relação do WhatsApp com o usuário é relação de consumo?

Entendo que sim. Embora haja gratuidade aparente, estamos falando de remuneração indireta, já que é sabido que o WhatsApp pertence ao Facebook, que faz uso de todos os seus dados, inclusive com finalidade comercial.

Quem nunca adicionou uma pessoa ao WhatsApp e dias depois recebeu sugestão do Facebook para adicioná-la como amigo na sua página?

Feitiçaria? Destino? Não… tecnologia a serviço do Facebook.

Outra discussão pode surgir: mas se é serviço, pode ser considerado essencial e ter a garantia da continuidade prevista no CDC?

O Marco Civil da Internet garantiu que o acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, podendo, no meu entendimento, se aplicar o conceito de essencialidade do CDC ao serviço prestado pelo aplicativo, cabendo assim a garantia da continuidade e da não suspensão da prestação do serviço, também prevista no Marco Civil.

Outro aspecto importante é que o Marco Civil garantiu ao usuário da rede a neutralidade na prestação de serviço.

Isso quer dizer que o prestador de serviço de internet não pode discriminar o que o usuário deseja usar, estando entre os princípios da lei a liberdade de usar os dados da maneira que preferir.

Na minha opinião havia outra formas de compelir o prestador de serviço a colaborar com o Poder Judiciário na investigação criminal, inclusive responsabilizando-o criminalmente, caso permanecesse inerte.

Suspender os serviços do aplicativo de comunicação de um grupo elevado de usuários por não ter o prestador de serviços fornecido dados sigilosos à justiça equivale, mutatis mutandis,  a suspender o fornecimento de água de toda uma população em razão de um dos diretores da concessionária ter praticado um crime, ou seja, além de desproporcional a decisão me parece ineficaz para o fim que se deseja.
Prof. Marco Antonio