Por trás de um muro e uma fachada pintada esconde um cenário que entristece qualquer profissional da educação: goteiras, portas e portões quebrados, banheiros com pias e vasos sanitários danificados, falta ou incompatibilidade das carteiras com a idade dos alunos, ausência de livro didático, merenda escolar e fardamento escolar.
“Quando chove aqui vira uma peneira”; “Como exigir dos alunos alguma coisa, se quem deveria dá o exemplo não dá?”; “Dá uma frustração vê isso tudo. Às vezes me pergunto o que eu estou fazendo?… Você tem que despertar o interesse dos alunos, mas como diante de uma situação caótica como essa?”. Essas são algumas lamentações de professores e funcionários de escolas e creches do município de Santa Rita, na Região Metropolitana de João Pessoa.
Em uma das escolas, a Governador Flávio Ribeiro, no Centro, o muro de fora está pintado, escondendo o interior que apenas quem trabalha ou estuda sabem das péssimas condições do local. Dois dias dessa semana, os estudantes ficaram sem aula porque a unidade ficou alagada, impossibilitando o funcionando.
O teto está comprometido com inúmeras goteiras, faltam carteiras ou não correspondem com a idade dos alunos, professores estão trabalhando sem livro didático e a merenda se resume a bolacha e leite todos os dias quando tem. Nos fundos da escola se formou um buraco enorme que ameaça derrubar algumas paredes da sala e parte do muro que cerca a unidade de ensino. Além da constatação da promotoria, a denúncia foi feita nas redes sociais. Não houve aula dois dias dessa semana por conta das chuvas.
“As paredes estavam passando corrente elétrica. Há dois anos os alunos não têm aula de educação física por conta desse buraco na área que deveria servir para as atividades dos estudantes”, relataram vários profissionais. No entanto, essa situação também afeta outras escolas. Um exemplo disso é a Índio Piragibe. Ela está com o telhado comprometido e as descargas quebradas. Nos centros de educação infantil ou creches como a Elias Heckman, as crianças dormem em colchões velhos e lençóis emprestados pelos funcionários.
“A gente é quem está comprando material de limpeza para limpar a creche. Falta toalha, sabonete, roupa, verdura e frutas. Essas crianças nunca viram uma fruta aqui”, afirmou uma profissional da educação.
A Promotoria de Defesa dos Direitos da Educação de Santa Rita recomendou no último dia 18 que a Prefeitura encaminhe até julho um relatório apresentando a regularização da situação de 34 escolas e creches do município. A infraestrutura das escolas é considerada pelos profissionais de ensino de caótica.
A reportagem do Jornal Correio da Paraíba visitou algumas unidades no dia de ontem e, a princípio, acreditava-se que nenhum profissional se propusesse a falar por medo de retaliações e perseguições, mas o sentimento de revolta era visível nos olhos de professores e funcionários que cobram mudanças estruturais e valorização da educação.’
As recomendações foram expedidas pela promotora de Justiça Ana Maria França e integram um procedimento administrativo para apurar a qualidade da educação pública e as instalações físicas das escolas e creches. Foram realizadas fiscalizações do MP em conjunto com o conselho tutelar que constataram irregularidades nas escolas e creches.
A promotora destaca, nas recomendações, que o princípio da garantia do padrão de qualidade do ensino, além do processo ensino-aprendizagem, engloba as instalações físicas do local em que é ministrado, o transporte escolar, a qualidade da merende servida, entre outros.
“A inobservância desse princípio constitucional é uma das principais razões da evasão escolar e das baixas médias obtidas nas avaliações nacionais da qualidade do ensino”.
Alunos especiais sem acesso a escola
Os alunos da zona rural de santa Rita estão impedidos de ter o acesso as escolas desde o início desta semana, pois os motoristas que transportam os estudantes estão há três meses sem receber o salários e eles decidiram parar de prestar o serviço. Além disso, algumas salas da educação especial foram fechadas e outras funcionam precariamente. De acordo com professores, é necessário a presença de profissionais especializados para cuidar das crianças, assim como também faltam intérpretes nas escolas como na Emília Cavalcanti, em Lerolândia. “Eles estão colocando profissionais sem qualificação para a readaptação na educação especial nas escolas que tem, mas está servindo de depósito de profissionais”, afirmaram professores.
Salários descontados e congelados
No mês passado, os professores fizeram uma paralisação de sete dias e a Justiça decretou ilegal a greve, determinando o retorno, mas sem descontar os dias de paralisação. No entanto, os professores denunciaram que neste mês foram descontados três dias e já tem a informação de que vão descontar os quatro no próximo mês. Além disso, há dois anos a categoria não recebe reajuste, mesmo em vigor a lei do magistério que determina aumento todos os anos. O terço das férias de 2017 está sendo pago em ordem alfabética mensalmente e as férias deste ano ainda não foi pago.
Carlos Ventura: vice-presidente do Sindicato dos Professores
“As escolas de Santa Rita estão sucateadas. Tem vários problemas. Não tem uma sala específica para os alunos especiais. A situação é precária. As escolas estão cheias de matos, falta merenda. Está tudo virado de cabeça para baixo. Falta fardamento. Não tem livro suficiente para os professores fazerem o planejamento das aulas e eles têm que se virar. Não é oferecido condições de trabalho”
Lissandro Saraiva – professor da zona rural de Santa Rita
“São 10 horas e estou uma hora dessas no sindicato porque fui dá aula e não tinha merenda. A diretora liberou os alunos porque nós damos aula em áreas carentes que para alguns alunos uma das refeições mais importantes no dia é a merenda escolar. E aí você chega numa escola e a diretora não tem condições de segurar os alunos”
Professor que preferiu não se identificar
“Não é só uma questão salarial, mas é a falta de condições estruturais. Como cobrar dos alunos que ele não pode quebrar o ventilador, por exemplo, se o ventilador nem funciona?”
Existem 75 unidades de ensino entre escolas e creches em Santa Rita
Entre as medidas recomendadas estão o conserto e substituição de portas, portões e janelas, pintura; reparos na infiltrações, vazamentos e goteiras; substituição de fiação; conserto e substituição de vasos sanitários e pias; construção de rampas para acesso às escolas; aquisição de extintores e sinalização; aquisição de armários, ventiladores, e lousas; e construção de biblioteca.
Caso haja descumprimento das recomendações, serão adotadas as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis.